Foto: Myke Sena
Sete anos depois da perda da irmã em um acidente de carro, a saudade ainda faz parte da vida da enfermeira Alessandra Justino, moradora de Brasília. Mas em meio à dor, o que traz conforto a ela e à família é que partes da irmã continuam vivas em muitas pessoas. É que os órgãos foram doados. “A gente sente muito orgulho até hoje de ter conseguido fazer a doação de órgãos da minha irmã, é uma coisa incrível”, disse.
A doação foi possível porque a irmã de Alessandra teve morte encefálica, quando todas as funções do cérebro param de funcionar de forma irreversível. Nesse caso, órgãos como coração, fígado, rins, pulmões e córneas continuam funcionando e podem ser transplantados em outras pessoas.
Segundo o Ministério da Saúde, atualmente, 53.218 pessoas aguardam na fila de espera de um órgão ou tecido. Por outro lado, ainda existe resistência por parte das famílias em liberar os órgãos de ente que teve morte encefálica. Só neste ano, dos 5.857 registros de morte encefálica, apenas 1.451 tornaram-se doadores efetivos. A taxa de rejeição por parte das famílias foi de 37,8% em 2021, mas esse número já foi maior. Em 2018, por exemplo, chegou a 41,3%.
E para mudar essa situação, o Governo Federal lançou a Campanha Nacional de Doação de Órgãos na manhã desta segunda-feira (27), em Brasília.
“A campanha que a gente lança hoje chama atenção para dois aspectos. O primeiro é sensibilizar todo o brasileiro da importância de se doar órgãos. O primeiro ponto é a pessoa se convencer. E após se convencer, ela precisa entender que isso não basta. Ela precisa conversar com a família porque a legislação do Brasil diz que a palavra final para doação de órgãos não é da pessoa. Então não basta estar registrado na Carteira Nacional de Habilitação, não basta ter um registro em cartório. A família é que tem que aprovar e dar a palavra final de doação”, ressalta o ministro da Saúde substituto, Rodrigo Cruz.
No caso da irmã de Alessandra Justino, essa conversa com a família foi importante para que se cumprisse um desejo dela. “A minha irmã fez isso. Em vida, sempre falou da questão da doação de órgãos, sempre falou quanto ela achava importante doar”, conta Alessandra. A doação ocorreu depois que a família conversou com médicos do hospital e assistente social. “Depois de alguns meses, eu recebi uma carta para falar que ela tinha doado as córneas. O Instituto dos Olhos mandou uma carta muito bonita para minha família. Foi muito legal ter recebido isso e até hoje a gente lembra desse carinho que eles tiveram com a gente”.
Lista de espera
Entre as 53.218 pessoas que aguardam na fila de espera por um órgão ou tecido, 31.125 esperam por um rim. Em seguida vem córnea (19.115), fígado (1.905), transplante duplo de pâncreas e rim (387), coração (365) e pulmão (259).
Entre as metas do Ministério da Saúde para aumentar o número de transplantes está a identificação de 100% dos casos de morte encefálica. Hoje, cerca de 23% dos casos não são identificados. Mesmo assim, o Brasil possui o maior sistema público de transplante do mundo. A estrutura conta com uma Central Nacional, localizada na sede do Ministério da Saúde, em Brasília, onde 17 profissionais trabalham 24 horas por dia na parte de logística. Cada capital conta também com uma central estadual. São 648 hospitais de transplantes habilitados em todo o país. Só no ano passado, o Governo Federal investiu R$ 1,16 bilhão nesses serviços. De 2008 a 2020 foram R$ 15 bilhões. Em 20 anos, o Sistema Único de Saúde (SUS) realizou cerca de 412 mil transplantes.
E para apoiar os hospitais integrantes do Sistema Nacional de Transplantes e garantir a qualidade desses serviços, o Ministério da Saúde vai conceder incentivo financeiro para ações de doação e transplantes na rede pública de saúde. O objetivo é estabelecer critérios e níveis de desempenho para essas unidades, baseados em qualidade de atendimento, indicadores de segurança do paciente, acesso, entre outros. Com base nesses parâmetros, cada hospital será classificado e receberá uma pontuação, que irá resultar em um percentual maior de recursos.
Números
O Brasil, atualmente, conta com:
1 Central Nacional de Transplantes;
27 Centrais Estaduais;
648 Hospitais de Transplantes habilitados;
1.253 Serviços de Transplantes habilitados;
1.664 Equipes de Transplantes habilitadas;
78 Organizações de Procura por Órgão (OPO);
516 Comissões Intra-hospitalares de doação de órgãos e tecidos para transplantes;
52 Bancos de Tecido Ocular;
13 Câmaras Técnicas;
12 Bancos Multitecidos;
48 Laboratórios de Histocompatibilidade.
O que fazer para ser doador de órgãos
São duas opções de doador: O primeiro é o doador vivo, que pode ser qualquer pessoa que concorde com a doação, desde que não prejudique a sua própria saúde. O doador vivo pode doar um dos rins, parte do fígado, parte da medula óssea ou parte do pulmão. Pela lei, parentes até o quarto grau e cônjuges podem ser doadores. Não parentes, só com autorização judicial.
Já para doação de medula óssea, o candidato a doador deverá procurar um hemocentro para a coleta de uma amostra de sangue (10ml) para a tipagem de HLA (exame de histocompatibilidade que identifica as características genéticas de cada indivíduo). Os dados do doador são inseridos no cadastro do Redome e, sempre que surgir um novo paciente, a compatibilidade será verificada. Uma vez confirmada, o doador será consultado para decidir quanto à doação.
O segundo tipo é o doador falecido. São pacientes com morte encefálica, geralmente vítimas de catástrofes cerebrais, como traumatismo craniano ou AVC (derrame cerebral). Para ser um doador, basta conversar com sua família sobre o seu desejo de ser doador e deixar claro que seus familiares devem autorizar a doação de órgãos em caso de morte encefálica.
Por Governo Federal